Friday, July 25, 2008

Parágrafo Perdido #2

Tinha acordado meio estranho. Igual, mas diferente. Não era mau-humor, como normalmente me acontece às segundas e às quintas. Eu estava preso. Me sentia como um pobre diabo no corredor da morte, fazendo a mesma coisa que faz todas as manhãs, um dia de cada vez em direção ao destino que já lhe foi traçado vários anos antes – e que ainda vai demorar outros tantos anos pra chegar. E isso me deixou puto. Fui tomar café e tudo me irritava. A cestinha de pão no meio da mesa me enchia de raiva. O pote de geléia. Minha xícara do Garfield. Tudo parecia um alarme escandaloso que escancarava pro mundo inteiro o quanto minha vida  era patética e desinteressante. E como eu não tinha escapatória dela. Dirigi até o trabalho buzinando muito, coisa que nunca faço, pros idiotas que insistiam em se meter na minha frente ou não me deixavam mudar de pista, todos fazendo isso de propósito só pra me incomodar, claro. No escritório eu quase explodi. Aquele computador velho com o qual luto todos os dias pra poder trabalhar, entregue pra mim quase que como favor, como se fosse muito mais do que eu mereço, refletia minha cara medíocre e incapaz de reivindicar algo melhor. E aí fiquei com mais raiva ainda. Como eu era feio! Meu chefe apareceu e então eu percebi a enorme cara de filho da puta que ele tinha. Falava comigo como se eu não fosse digno, como se tivesse que dar graças a Deus por ter recebido a oportunidade de me matar todos os dias pra ganhar um salário miserável que nem paga minhas contas no final do mês. Que filho da puta! Só um louco pra não tomar uma atitude numa situação dessas. E posso até ser um covarde acomodado sem qualquer perspectiva de felicidade, mas louco de jeito nenhum!

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